quinta-feira, 1 de junho de 2023

Porque não fui na Virada Cultural 2023

No sábado, 27 de maio de 2023, alguns amigos me perguntaram se eu iria na Virada Cultural e minha resposta era de "Não" a "Nem que me paguem". Minha resposta era sempre seguida de uma outra pergunta do interlocutor: "Por quê?". E aqui segue a minha resposta. 




Quando eu estive pela primeira Virada Cultural, entre os dias 19 e 20 de novembro 2005, meus olhos se encheram de possibilidades e de vida cultural. Pra além de arte se vivia a cidade de São Paulo, a gente transitava pelo centro sem preocupação, saíamos da periferia para ocupar o centro da cidade. Quando a virada expandiu nos anos seguintes, com equipamentos culturais públicos e privados em diversas regiões oferencendo programações, tornou-se uma coisa incrível, podíamos transitar. Com o transporte público 24 horas na Virada, construíamos pertencimento ao sair da programação de um palco no centro e ir para alguma unidade do SESC ou Centro Cultural em um bairro vivenciar outra manifestação. A graça da descentralização não era a concentração em poucos palcos periféricos, mas a pulverização pela cidade em múltiplos pólos. São Paulo é muito grande, mas o paulistano quer conhecer cada quilometro, não só aqueles poucos metros que a SMC determina no seu pseudo mapa cultural. Sentia-se naquela época uma experiência de mobilidade urbana na madrugada durante a Virada Cultural, que aquecia os corações e mentes e apontava para uma outra possibilidade para essa cidade de São Paulo tão massacrada e barbarizada. 

A Virada Cultural do prefeito Ricardo Nunes com a secretária Aline Torres, virou um evento de grandes cercados, que transformam-se numa hora em abatedouros para o crime, noutra hora em desconfortáveis isolamentos da cidade. A mesma Secretaria de Cultura tentou fazer igual com o Carnaval, criando currais para foliões com filas imensas e morosas. A sorte da população é que o folião de carnaval sabe subverter o estrangulamento da alegria e não se prenderam unicamente a determinação. Mas parece que o apreciador cultural não sabe se defender quando o intento é sucatear a vivência cultural. Em outros tempos pais e avós octagenários de amigos sentiam-se seguros de sair para curtir um palco no Arouche ou um show no Anhangabaú. Pais sentiam-se confortáveis para levara seus bebês para curtir a Rua São João ou a Rua Vieira de Carvalho.  Principalmente por ser um espaço aberto, sem cercas e com milhares de pessoas, uma possibilidade impar de respirar a cidade e suas potencias. Se estivéssemos evoluindo em cultura e realmente descentralizando sentiríamos a mesma liberdade de ganhar as ruas e pertencer a cidade nas última viradas na cidade como um todo. Fato é que não dá para respirar profundamente arte e cultura numa gestão municipal de cercamento e sufocamento. 

O sufocamento cultural já começa na forma como a Secretaria Municipal de Cultura tratou os artista  independentes da própria cidade. Em outros tempos estes artistas independentes tinham palcos menores que serviam de acesso para os palcos maiores e acabam fazendo com que os mesmo ganhassem visibilidade, além de constarem merecidamente na folha de pagamento da Secretaria Municipal de Cultura. Olhando a programação da Virada Cultural 2023 vi pouquíssimos artistas independentes. Talvez por não terem sido convidados, quem sabe seja porque a gestão de Aline Torres resolveu chamá-los de "artistas não consagrados pelo público e pela crítica" e colocá-los em uma afrontosa, desumana e precarizada "Portaria 32". Na Portaria o artista que ainda não tem vínculo com o mercado e não consegue apresentar três notas fiscais "consagratórias" do seu valor artístico é submetido a um cachê ínfimo, enquanto vê a mesma Secretaria pensar na possibilidade de gastar 10 milhões com uma Virada Cultural no metaverso para um público incipiente. Portanto, a dita "Virada Cultural do Pertencimento" não gerou pertencimento para os artistas independentes da cidade. Mas o marketing da Secretaria de Cultura bombou em pertencimento, basta ver as redes da Secretaria Municipal de Cultura que instagramizam tudo. O marketing da Secretaria de Cultura é uma grande ilusão que esconde o cercamento e sufocamento que está acontecendo a cultura desta cidade.

O certo é que ano que vem é ano eleitoral, Ricardo Nunes e Aline Torres passarão e os passarinhos artísticos independentes da cidade de São Paulo poderão voar para fora das gaiolas culturais desta gestão. Assim espero. 




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