sábado, 13 de setembro de 2014

CARTA DE TRÉGUA PARA LINDEZA

Querida Lindeza,

Fiquei lisonjeado com a sua preocupação em querer saber como é que eu estou e sinceramente espero que você esteja bem. Eu estou como não deveria estar, mas se é assim que estou, é assim que é estar bem nesse momento, o ruim é não estar de forma alguma. 

Pensei bastante no que iria responder à você. Sei que Lindeza vem de lidmo, que significa "aquilo que é legítimo". Sabendo que você pode conter toda uma bela e pura autenticidade, não podia agir com você de forma diferente. Faz tempo, mesmo que relativamente, que nosos caminhos seguiram vias distintas nessas encruzilhadas. Eu, por mais que goste também de fazer aquilo que tenho vontade, não queria ser leviano e me deixar levar pelas emoções momentâneas, ou pelos rancores de egos feridos, ou, ainda, pelo choramingo de quem queria viver algo e não viveu. Queria que a minha resposta fosse da mesma forma como eu busco ser: uma tentativa poética. 

Resolvi me afastar para curar minhas feridas. Como Eros preciso que a queimadura cure para poder voar até Psique. Sei que Dante precisou superar muita coisa para conseguir embrenhar-se numa floresta escura, para vencer infernos e purgatórios até alcançar o paraíso da visão de sua Beatriz. Entendo a necessidade de nos falarmos e sinto a necessidade e a falta de nos vermos, mas creio que, frente às escolhas, é melhor deixarmos assim. É melhor para todos nós três que assim fique. Mesmo cego de amor por você Lindeza, sei as consequências de uma guerra de Tróia e, ao invés de ser Páris e te raptar, minha Helena, prefiro usar minha cegueira numa ação epopéica digna de Homero. 

Uma vez uma amiga me disse que eu não vivia, que tudo que eu fazia era assentado nos livros que eu lia. Lógico que eu fiquei bem chateado na época, mas depois eu compreendi que leio porque vivo e vivo porque leio. A literatura muitas vezes encontra tradução na vida e a vida acenta na escrita. Fiquei esses últimos dias pensando num livro do Mário Benedetti, A trégua. Acho que pude entender que vivemos juntos um período de trégua no meio de guerras, as minhas e as suas. Todo amor é um período de trégua diante da selvageria que é o resto da vida. Você foi a Avellaneda deste Martín. Foi um belo aposto. E é isso que quero que fique para mim. O que vivemos juntos foi Nosso. Incorruptivelmente Nosso. As lembranças ficarão me esperando no meio da noite, em todas as noites nas quais eu tenha que retomar o fio da minha insônia e olhando para a janela ou para um pedaço de papel, eu pronuncie ou escreva a palavra:"Poesia". 

Sempre,

Seu Poeta!

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