segunda-feira, 7 de janeiro de 2013

DEDINHO DE PROSA COM DU


- Cê fica entretido nessa maquininha ai. Tá estudano para medicina?
- Não, sou escritor, estou trabalhando num livro.
- Uhé! Ai é bom! Minha filha tinha um trenzin desse. Ela ficava lá envorvida, puxava um monte di coisa, ficava sabendo di um monte di coisa. Só qui ela passou a puxa o qui não presta, dai eu mandei tirar tudo, cortei. Dai não pode, né?
- Às vezes.
- Eu queria podê escrever um livro, mas num posso não. Estudei só até a quarta série, daí parei di mexê com isso. Eu escrevo carta, mas nunca mandei uma carta para ninguém. Tenho medo di na hora que eu estivé escreveno risca alguma coisa errada e chegá lá pro outro tudo errado.
- Mas isso não tem importancia não. Tem que mandar. É errando que se aprende.
- Teve um moço que me mandou uma carta uma vez. Eu nunca respondi. Tava lá até onti. Peguei e rasguei. Sabe? Pra num ficá lembrando.
- Mas é bom ter lembrança.
- Que nada. Dá uma gastura. Um sentimento mei ruim. Dai é melhor rasgar, pra pará de ter sentimento forte.
- Eu guardo tudo. Gosto de colecionar lembranças. Aqui nesse computador tem muita coisa guardada e lá em casa também.
- Mas para o sinhô é bom, porque o sinhô escreve. Eu não escrevo nada. Eu guardo uma rosa que meu primeiro namorado me deu. Tá lá, toda seca, dentro de um caderninho. Dizem que a primeira pessoa na nossa vida a gente não esquece, num é verdade?
- É verdade. A primeira pessoa na nossa vida deixa marcas.
- O sinhô tem uma pessoa assim?
- Tenho.
- Uhé! Olha eu pegano intimidade com o sinhô. Disculpa.
- Imagina. Tem problema não.
- É que eu gosto de conversar. Ai que é bom, não é?
- E é. É assim que a gente conhece de verdade as pessoas.
- Outro dia eu pensei em jogar a rosa fora. Deu saudade e o pensamento passou pela minha cabeça. Mas eu quetei e desisti. Deixa ela lá. Quem sabe um dia ele volta. Daí a gente lembra dos momentos bons. Uhé! Ai é bom!
- Ôh! Si não. hahah!
- Hahaah! O sinhô é engraçado. Gostei de conhecer o sinhô.
- Também gostei de conhecer você.
- O sinhô indo embora, não esquece de mim não. Pega meu endereço. Pode inté me escrever uma carta si quiser. Só não sei se vô responder. Sou ruim de escrevê.

Montes Claros, 27/12/2012

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